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Hip-Hop e Maternidade: Quando a Cultura Abraça, Ela Cresce

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Maio é o mês em que se celebra o Dia das Mães, e além das homenagens, é importante dar espaço para a reflexão que a data nos convida a fazer: vivemos em um mundo que dá suporte para as mães? Mais uma vez, uma questão social se desdobra na cena do Hip-Hop, já que os enfrentamentos e desafios das mulheres que maternam e, ao mesmo tempo, participam da cena são inúmeros. 

Pensando nisso, convidamos Tamiris Paula e Beatriz Deilays para compartilhar suas vivências do lugar da maternidade. Integrantes do Projeto Cult.iva e coordenadoras do C.E.D.U (Coletivo de Estudos em Danças Urbanas), elas falaram sobre as transformações profundas que a maternidade trouxe para suas trajetórias dentro da cultura. O resultado é um relato honesto a respeito desse tema, além de uma reflexão potente no sentido de pensar como tornar a cultura mais sensível e acolhedora para as mães.



Autoestima Abalada e Espaços que Não Acolhem


Tamiris Paula é mãe de três filhos e, ao ser questionada sobre como a maternidade afetou sua vivência dentro da cultura Hip-Hop, ela levanta dois principais enfrentamentos: o impacto na sua autoestima e a falta de acessibilidade e acolhimento que as mães e crianças encontram nos eventos de Hip-Hop. Ela conta que, a partir da primeira gestação, sua forma de se olhar foi transformada de maneira significativa, tanto corporalmente quanto em termos de identidade. Para Tamiris, a experiência da maternidade balançou as estruturas do modo como se via, já que fez com que ela se colocasse em segundo plano, priorizando o filho que tinha acabado de chegar e mergulhando profundamente no papel de cuidado. Nesse contexto de tantas transformações, ela acabou encontrando uma dificuldade muito grande de se sentir confortável ao dançar, ser vista pelos outros e até mesmo se ver em vídeos, experiências essas que eram muito corriqueiras antes da gestação.


“A dança era onde eu me sentia forte, era meu super poder. E se tornou a coisa mais dolorosa para mim. Eu não conseguia me ver.” (Tamiris)

O impacto que sentiu em sua autoestima, somado à falta de acolhimento ao tentar retornar à cena, fez com que ela parasse de dançar por um período. Após uma pausa de três anos, e incentivada por sua irmã, Tamiris criou o coletivo Street Sisters, retomando sua carreira na dança. O coletivo surgiu com a premissa de oferecer um espaço para que mulheres se desenvolvessem dentro da cultura, especificamente na dança. Assim, ela encontrou um caminho, transformando sua experiência dolorosa em potência, ao criar um lugar onde mulheres (incluindo mães) pudessem desenvolver suas habilidades e reconhecer sua força dentro de um ambiente seguro e incentivador.

Atualmente, com dois de seus filhos ainda pequenos, Tamiris segue encontrando dificuldades dentro do cenário do Hip-Hop. Ela ressalta o quanto os organizadores de eventos da cena costumam desconsiderar necessidades estruturais que viabilizem a presença das mães e de seus filhos nesses espaços. Sobre esse assunto, ela destaca tanto aspectos físicos,  como a presença de fraldários, espaços tranquilos para amamentar e suporte de ambiente adequado para o cuidado com as crianças, quanto questões relacionadas às atitudes, como o auxílio para que as mães possam participar ativamente das atividades, a compreensão em relação à presença das crianças e a flexibilização diante das demandas da maternidade.

Diante dessas dificuldades, e de uma constante sensação de “estar incomodando” ao marcar presença nos eventos ou desenvolver trabalhos como aulas de dança, Tamiris interrompeu algumas atividades novamente. Ainda assim, ela vem buscando retomar a dança de maneira mais ativa. Para ela, apesar dos obstáculos, tem sido possível ver outras mães encontrando formas de permanecer na cena e ocupar espaços, o que considera uma inspiração para seguir em frente.



Quando apoiar é essencial…


Beatriz Deilays conta sobre como sua vida mudou quando descobriu que estava grávida. Na época, trabalhava exclusivamente com dança, mas precisou rever seus projetos e planos levando em conta o fato de que agora seria responsável pela criação de sua filha. Um dos maiores desafios que ela relata, ainda no período da gestação, foram os sintomas físicos que a impediam de estar tão presente quanto gostaria tanto nas aulas que ministrava quanto nos eventos. Bia ressalta o quanto a rede de apoio foi imprescindível para ela nesse período. Ela faz questão de mencionar a ajuda da amiga, Franciele Carvalho, que dava aulas em seu lugar quando ela não se sentia bem fisicamente, mas manteve o pagamento para a Bia. Segundo ela, isso foi fundamental para se manter ativa e ainda conseguir manter sua renda. 

Assim como Tamiris, Bia fez uma pausa na sua carreira depois do nascimento da filha. Passado algum tempo, foi retornando ao cenário da dança gradualmente, levando a filha para as aulas, contando com a rede de apoio familiar, e também com os colegas da dança para a auxiliarem ficando com a filha enquanto ela praticava, e sendo acolhedores com a presença dela naquele espaço. Segundo ela, poder estar nos espaços com a filha foi um aspecto fundamental para se manter na cena. 

Mesmo contando com apoio e incentivo, ela não ficou imune às dificuldades características da maternidade. Bia pontua que existe uma frustração por não conseguir investir tanto tempo e energia na dança quanto gostaria, e além disso, menciona que diante de sua presença mais reduzida nos espaços da cultura Hip-Hop, ela acaba por receber menos convites e sente que as pessoas assumem que ela simplesmente não vai poder estar em determinados lugares ou eventos única e exclusivamente por ser mãe. Ainda sobre essas limitações, Bia traz uma reflexão importante: o Hip-Hop não nasce nos espaços acadêmicos, então a presença das mães não é só mais dificultada em aulas, mas também em espaços sociais que remontam à essência do Hip-Hop.


Querendo ou não o Hip-Hop nasceu nas ruas e vai continuar sendo das ruas. Então a gente gosta de estar em uma festa, né? A gente gosta de estar fazendo presença. Isso faz muito parte da cultura, conhecer novas pessoas, interagir, trocar, adquirir conhecimento. Porque a gente adquire muito conhecimento nesses rolês.” (Bia)

Bia e Tamiris, ao falarem sobre sua trajetória, mencionam períodos de enfrentamento que as fizeram se retirar da cena por um período. No caminho de volta para prática da dança, encontraram desafios, mas ambas se sustentam em uma esperança: tem como mudar o cenário. Tamiris salienta o quanto ver outras mães ocupando espaços na cena é algo que a motiva a continuar. Bia ressalta a parceria com a própria Tamiris no C.E.D.U como algo que a conforta, pois considera um privilégio contar com alguém que compreende essa realidade para desenvolver, na prática, estratégias que as mantenham ativas e conectadas com a cultura.

Os relatos são alertas para os pontos que precisam ser olhados com mais atenção quando se trata do acolhimento da maternidade na cena. Mas são também direções que apontam caminhos possíveis: garantir infraestrutura adequada nos eventos, ampliar a compreensão da maternidade como parte da cultura e fortalecer redes de apoio são ações que podem transformar o Hip-Hop em um espaço mais inclusivo. Para nós, do Projeto Cult.iva, pensar nesse acolhimento é mais do que incentivar a presença das mães. É garantir que suas vivências não sejam silenciadas, que seus filhos cresçam com referências potentes e que a cultura permaneça presente através das gerações. A maternidade acolhida é condição de continuidade da cultura. 



Tamiris e Bia com alunas no retorno do Coletivo de Estudos em Danças Urbanas (04/Maio/2025)
Tamiris e Bia com alunas no retorno do Coletivo de Estudos em Danças Urbanas (04/Maio/2025)


Você é mãe? Se sente acolhida e integrada na cena? Vem contar pra gente sua experiência!  Envie um e-mail para: cultural.cultiva@gmail.com

 
 
 

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Projeto independente, o Cult.iva traz a Ribeirão Pires-SP um evento de Hip-Hop com oficinas, batalhas, apresentações e troca de experiências.

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